Gestalt-terapia: Uma Introdução

Gestalt-terapia foi o nome de batismo, decidido por Frederick Perls, para uma nova terapia que desenvolvera, desde 1946, junto com o grupo de intelectuais que se intitulava “Grupo dos Sete” (Isadore From, Paul Goodman, Paul Weisz, Sylvester Eastman, Elliot Shapiro, Ralph Hefferline, Laura e Fritz Perls). A Gestalt-terapia é uma síntese coerente de várias correntes filosóficas, metodológicas e terapêuticas, formando uma verdadeira filosofia existencial, uma forma particular de conceber as relações do ser vivo com o mundo.
O novo método foi nomeado, sucessivamente, como terapia da concentração; terapia do aqui e agora; psicanálise existencial; terapia integrativa; terapia experiencial; psicodrama imaginário. Finalmente, Fritz Perls sugeriu “Gestalt-terapia”, o que suscitou debates particularmente agitados com seus colegas, e, apesar de esse nome ter sido considerado estrangeiro e esotérico demais, foi o escolhido por Perls, por motivos de provocação e de marketing.
O termo “Gestalt-terapia”, portanto, surge em 1951, com o lançamento do livro Gestalt therapy – excitement and growth in human personality, escrito por Frederick Perls, Paul Goodman e Ralph Hefferline.
É difícil encontrar uma definição sumária para Gestalt-terapia, já que a própria teoria propõe uma consciência que não se limite ao âmbito do racional, mas inclui a dimensão corporal e sensória; enfatiza a experiência vivida, o contato e o diálogo. Impossível reduzir um conceito assim a poucos parágrafos. Dessa forma, foi necessária uma colagem de conceitos, organizados sob uma nova Gestalt, para dar um sentido a este verbete.

A Gestalt deve seu surgimento às intuições geniais e às crises pessoais daquele que devemos considerar seu principal fundador: Fritz Perls. De fato, ela foi amplamente articulada e formalizada por Laura Perls e Paul Goodman, e também por seus primeiros colaboradores e pelos continuadores de segunda e terceira “geração” (Isadore From, Jim Simkin, Joseph Zinker, Ervin e Miriam Polster etc.). (Ginger; Ginger, 1995, p. 44)

Gestalt-terapia é uma psicoterapia que enfatiza “concentrar na estrutura da situação concreta; preservar a integridade da concretude encontrando a relação intrínseca entre fatores socioculturais, animais e físicos” (PHG, 1997, p. 50). É uma atitude básica, que se diferencia ao mesmo tempo da psicanálise e do comportamentalismo, constituindo uma “terceira via” original: compreender e aprender, mas, sobretudo, experimentar e promover nosso poder criativo de reintegrar as partes dissociadas; expandir ao máximo nosso campo vivido e nossa liberdade de escolha, tentar escapar ao determinismo alienante do passado e do meio, à carga de nossos condicionamentos “históricos” ou “geográficos” e encontrar assim um território de liberdade e de responsabilidade.
Portanto, nessa perspectiva global, holística, a terapia visa à manutenção e ao desenvolvimento de um bem-estar harmonioso, e não à cura, à reparação de qualquer distúrbio, que subentenderia uma referência implícita a um estado de “normalidade”, posição oposta à do espírito da própria Gestalt-terapia, que valoriza o direito à diferença, a originalidade irredutível de cada ser.
Na prática, esses princípios desembocam em um método específico de trabalho, uma abordagem fenomenológico-clínica, isto é, centrada na descrição subjetiva do sentimento do cliente (sua awareness) em cada caso particular e na tomada de consciência “intersubjetiva” que está acontecendo entre ele e o terapeuta (processo de contato e suas eventualidades), apoiado em certo número de técnicas, às vezes chamadas de jogos, exercícios ou experimentos. “Mas é muito frequente que essas técnicas – algumas inspiradas no psicodrama e várias outras emprestadas de outras abordagens (análise transacional, por exemplo) – sejam confundidas com Gestalt, por pessoas que ignoram praticamente tudo a respeito de seus princípios fundamentais” (Ginger; Ginger, 1995, p.19)

Poder-se-ia dizer que a Gestalt propõe, de certa forma, uma inversão do processo de cura: em psicanálise, se supõe que a conscientização acarrete uma modificação do vivido, enquanto em Gestalt as modificações do vivido –por meio da experiência –permitem uma mudança do comportamento, acompanhada de uma eventual conscientização. Para os psicanalistas, o desaparecimento do sintoma é um “luxo”, para os gestaltistas, é a conscientização que é assim considerada. (Ginger; Ginger, 1995, p. 66)

A Gestalt-terapia se nutriu, explícita ou implicitamente, da combinação de numerosas correntes filosóficas e terapêuticas de diversas fontes: européias, americanas ou orientais. Algumas deixaram vestígios mais importantes na Gestalt atual: a fenomenologia, o existencialismo e a psicologia da Gestalt; a psicanálise, as filosofias orientais e a corrente humanista. No entanto, ela é mais que uma síntese dessas tendências; ela as reconfigurou como uma nova Gestalt. E uma visão de mundo que privilegia a relação e não os objetos, o processo em detrimento ao conteúdo.
Em seu aspecto clínico, a Gestalt-terapia se apresenta como uma terapia existencial-fenomenológica que objetiva aumentar a awareness do cliente, no aqui e agora da relação terapêutica, e, para isso, utiliza recursos como experimentos, frustração, fantasias dirigidas, e outros, facilitando o desenvolvimento do auto-suporte, a capacidade de fazer escolhas e a organização da própria existência.

Dicionário de Gestalt-terapia – Pierre Ferraz